Indenização para passageira impedida de embarcar por portar documento no nome de solteira

Vitória do escritório Torreão, Machado e Linhares Dias Advocacia garante indenização a passageira que foi impedida de embarcar em voo por portar documento apenas no nome de solteira.

A companhia aérea foi condenada a ressarcir em dobro o valor das novas passagens que a consumidora foi obrigada a adquirir, além de danos morais.

A sentença está reproduzida abaixo

“TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS
Juizado Especial Cível e Criminal do Núcleo Bandeirante
Número do processo: 0700290-42.2018.8.07.0011
RÉU: TAM LINHAS AEREAS S/A

Dispensado o relatório (Lei nº 9.099/95, art. 38).

[nome omitido] ajuíza ação de conhecimento, pelo rito da Lei nº 9.099/95, em desfavor de TAM LINHAS AÉREAS S/A, na qual requer: a) a condenação da ré à obrigação de ressarcir em dobro o que pagou por novas passagens aéreas, perfazendo o montante de R$4.374,00; b) condenação da requerida no valor de R$5.000,00, à título de reparação por dano moral.

A audiência de conciliação resultou infrutífera.

Os autos vieram conclusos para julgamento.

PASSA-SE A DECIDIR.

Presentes os pressupostos processuais da demanda e as condições da ação, passo à análise do mérito cujo ponto controvertido reside em definir: a) se foi devida a cobrança de novas passagens aéreas em razão da divergência no nome da autora nos bilhetes das passagens que adquiriu antecipadamente; b) se a conduta da ré lesou  direito da personalidade da autora.

Cuida-se de relação de consumo (CDC, arts. 2º e 3º).

a) Da falha na prestação do serviço e da repetição de indébito

A negativa da ré em permitir o embarque da autora teve como causa exclusiva o fato de a requerente não ter apresentado nenhum documento oficial que tivesse o seu nome de casada na hora da realização do check-in. A autora apresentou o seu registro profissional e carteira de habilitação que continham o seu nome de solteira. Trazia em mãos apenas cópia de sua certidão de casamento, certidão de nascimento das filhas e carteiras do plano de saúde em que era possível identificar o seu nome de casada.

Ante o obstáculo gerado para o embarque a partir do imbróglio formado, a autora requereu a alteração de seu nome no bilhete para o nome de solteira, acreditando que com isso afastaria o empecilho para o embarque na aeronave com sua família. Todavia, a ré também se negou a realizar a correção ao argumento de que a autora tinha preenchido o respectivo bilhete aéreo com o seu nome de casada. Em razão disso, as passagens originalmente adquiridas pela autora foram canceladas sem qualquer reembolso.

A respeito desse tema, a Resolução da ANAC nº 400, de 13 de dezembro de 2016, em seu art. 8º assim estabelece:

Art. 8º O erro no preenchimento do nome, sobrenome ou agnome do passageiro deverá ser corrigido pelo transportador sem ônus ao passageiro.

  • 1º Caberá ao passageiro solicitar a correção até o momento do check-in.
  • 2º No caso de voo internacional que envolva operadores diferentes (interline), os custos da correção podem ser repassados ao passageiro.
  • 3º Não se aplica o disposto no § 2º deste artigo nos casos em que o erro decorrer de fato imputado ao transportador.
  • 4º A correção do nome não altera o caráter pessoal e intransferível da passagem aérea.

 No caso dos autos, cumpriria à ré adotar providências imediatas à necessária correção do nome da autora para o seu nome de solteira, procedimento simplório. Todavia, em vez disso, negou-se a realizar o aludido procedimento, contrariando a aludida norma.

Vale ressaltar que a ré não deixou qualquer alternativa à autora. Agindo de forma abusiva reconheceu nela a adquirente dos bilhetes para cancelá-los, mas não para admitir o seu uso mediante simples correção de seu nome, adequando-o ao documento oficial e original que apresentou no momento do chek-in. Ora, se a cópia da certidão de casamento não serviu para admitir o seu embarque porque poderia servir de base para o cancelamento das passagens ao argumento de que a autora havia preenchido errado o seu nome. Com efeito, a negativa em corrigir o nome da autora mediante a apresentação de sua CNH que continha o seu nome de solteira se tornou injustificável, mesmo porque esse documento também continha outras informações, tais como o nº CPF, RG, data de nascimento, nome do pai e da mãe, informações que poderiam ser cruzadas com as informações constantes do check-out para resolver o imbróglio e admitir o imediato embarque da autora.

E mais, a ré não observou que a autora estava acompanhada por seus filhos e esposo, os quais possuíam o sobrenome que ela própria passou a ostentar após o matrimônio, conforme cópia da respectiva certidão de casamento apresentada durante o chek-in.

Em situação semelhante, a Eg. Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais do DF se posicionou pela ilegalidade da conduta da empresa aérea que recusou o embarque de passageiro em razão de equívoco no registro do nome da passageira. Confira-se:

CIVIL. CONSUMIDOR. EQUÍVOCO NO REGISTRO DO NOME DA PASSAGEIRA. RECUSA À CORREÇÃO DE ERRO SANÁVEL, CONSTATADO EM TEMPO E MODO. TEORIA DO RISCO DO NEGÓCIO OU DA ATIVIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MATERIAL CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO CONDIZENTE À EXTENSÃO DOS PREJUÍZOS. I.  De detida análise dos autos, constata-se que a parte autora: a) adquiriu passagens aéreas Brasília. Nova York com 2 escalas (São Paulo e Atlanta), por programa de milhas da recorrente junto à parceira Delta Air Lines, por meio da composição de 70 mil milhas e o valor de R$335,72 (Id 1765942); b) adquiriu passagens aéreas para o filho recém nascido (trecho Brasília – São Paulo pela empresa Avianca no valor de R$ 259,66 e o trecho São Paulo – Nova York pela Delta Air no valor de R$ 413,78, Id 1765933); c) contratou  transporte exclusivo no aeroporto de Nova York para o dia 20.6.2016 (Id 1765931); d) reservou diária em hotel no aeroporto de Atanta/USA para pernoite, em razão de escala prolongada (Id 1765946). II. Tese recursal adstrita à exclusão de responsabilidade da recorrente (culpa exclusiva dos requerentes) e à consequente inviabilidade de indenização dos danos materiais: A) Não prospera a alegação de excludente de responsabilidade (culpa exclusiva dos requerentes no preenchimento dos dados da passagem aérea), porquanto os consumidores, tão logo verificaram o erro na grafia do nome da 2ª requerente (registro de EMILIA, no lugar de EMILIANA) solicitaram à recorrente a alteração da grafia (antecedência de 12 dias – Id 1765938), o que foi expressamente negado. Com efeito, o vídeo de ID 1765945 não deixa dúvida de que a atendente, inclusive, se negou o recebimento da solicitação, ao afirmar que é necessário o senhor procurar o jurídico. B) Nesse contexto, ainda que não se possa imputar à recorrente a responsabilidade pela preenchimento dos dados dos passageiros, patente a sequência de falhas na prestação do serviço contratado:  (i) a simples divergência entre o nome na passagem adquirida e o nome constante no passaporte da 2ª requerente poderia ser facilmente resolvida por outros meios (comparação dos documentos, identificação no cadastro de numeração de passaporte, identidade ou CPF); (ii) infrutíferas as tentativas de solicitação para alteração do nome (inúmeros protocolos perante a recorrente e negativa de recebimento de solicitação pessoalmente- Id 1765949); (iii) postura desidiosa da empresa que não demonstrou ter prestado a devida assistência aos consumidores (Id 1765945). C) Nessa ordem de ideias, a empresa aérea deve indenizar os prejuízos materiais (CC, Art. 186 e Lei nº 8.078/90, Arts. 6º, incisos III, VI e VIII e 14, caput). D) Nesse quadro, não assiste razão ao recorrente quanto à impugnação dos valores a serem restituídos, uma vez que a estimativa apresentada pelos apelados (e acolhida na sentença) engloba valores diretamente decorrentes da falha na prestação do serviço (diárias de hotel, transporte terrestre, multas de cancelamento e aquisição de nova passagem). Precedentes: TJDFT, 1ª Turma Recursal, Acórdão n.852850, DJE: 11/03/2015, Acórdão n.936939, DJE: 02/05/2016; 2ª Turma Recursal, Acórdão n.998052, DJE: 24/02/2017; 3ª Turma Recursal, Acórdão n.742226, DJE: 12/12/2013. Recurso conhecido e improvido. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos (Lei nº 9.099/95, Art. 46). Condenado o recorrente ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. (Acórdão n.1034580, 07386552420168070016, Relator: FERNANDO ANTONIO TAVERNARD LIMA 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 27/07/2017, Publicado no DJE: 03/08/2017. Pág.: Sem Página Cadastrada.)

A conduta da requerida afronta o princípio da boa-fé (art. 4º, III, do CDC) que deve nortear os contratos, desde a sua formação até a execução (art. 422 do CC), tampouco atentou, minimamente, para o dever de colaboração. Em razão disso, deverá ser responsabilizada pelos danos causados à consumidora, além de sofrer as sanções previstas na legislação pertinente.

O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável (CDC, art. 42, parágrafo único).

No caso em análise, a parte autora desembolsou a quantia de R$1.237,73 pelas primeiras passagens adquiridas. Todavia, a autora foi compelida a comprar outras passagens aéreas, cujo preço cobrado foi indevido, uma vez que já havia um contrato de transporte aéreo entre as partes, que não foi executado em razão da prática abusiva perpetrada pela ré.

O valor das novas passagens para Maceió/AL foi R$1.768,35. A de Maceió para Brasília, R$418,80, o que totalizou R$2.187,15, portanto bem mais caras do que as que foram canceladas (R$1.237,73). Logo, tenho por indevida a cobrança da quantia de R$2.187,15, desembolsada a mais em razão do cancelamento abusivo das passagens.

Por conseguinte, o valor de R$2.187,15 deverá ser restituído à autora na forma dobrada porque não incide no caso em análise a hipótese de engano justificável. Vale dizer que a requerida já foi devidamente compensada pelos serviços que prestou à autora em razão do valor de R$1.237,73, que não lhe foi reembolsado.

Em razão disso, o pedido de repetição de indébito do valor de R$2.187,15 deverá ser julgado procedente para condenar a ré à obrigação de repeti-lo na forma dobrada, com os acréscimos legais.

  1. b) Da compensação do dano moral

Quanto aos danos morais, trata-se de fato que escapa à normalidade. A conclusão de que o fato gerou angústia à requerente é intuitiva e o fato somente não tomou maiores proporções em razão de sua condição financeira, já que foi compelida a desembolsar quantia considerável para adquirir novas passagens. Não fosse isso, as férias com sua família estariam comprometidas. Logo, o fato não pode ser tido como mero dissabor do cotidiano, porquanto afetou a paz de espírito da requerente em face da circunstância angustiosa que viveu até conseguir suplantar o obstáculo gerado pela prática abusiva da requerida.

A doutrina tem apontado critérios para sua fixação, dentre estes: a) a extensão e a gravidade objetiva do dano; b) o lugar da sua ocorrência (se em ambiente público ou privado); c) o conteúdo do ato em si; d) a situação social, a personalidade e a conduta da vítima; e) as suscetibilidades particulares da vítima; f) a retidão de vida do agredido; g) a condição econômica do ofensor e; h) a extensão do dano.

Considerando os critérios apontados, arbitro a indenização na quantia de R$3.000,00.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para:

a) condenar a parte ré a pagar à parte autora o valor de R$2.187,15, na forma dobrada, atualizada monetariamente pelo INPC desde 9/12/2017 e acrescida de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação;

b) condenar a parte ré a pagar ao autor indenização por dano moral no valor de R$3.000,00, corrigido monetariamente pelo INPC a contar desta data (STJ, súmula 362) e de juros legais de mora de 1% ao mês a partir da data de citação.

Resolvo o processo com exame do mérito com fundamento no art. 487, I do Código de Processo Civil.

Sem custas e sem honorários, por força do disposto no art. 55 da Lei nº 9.099/95.

Transitada em julgado, e nada sendo requerido no prazo de dez dias, arquivem-se com as cautelas de estilo.

Publique-se. Sentença registrada eletronicamente. Int.”

Compartilhe:

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp

Continue lendo: